Recentemente publicamos o post do projeto Montanhas Virgens nos Andes, falando sobre o prêmio da Mount Everest Foundation em parceria com a Royal Geographical Society (Sociedade Real Geográfica da Inglaterra), que financia atualmente a expedição de Maximo Kausch, Suzie Imber e Pedro Hauck. O alpinista, a pesquisadora física e o geógrafo estão na região andina (mais precisamente entre Chile e Argentina) em busca de montanhas virgens com mais de 5000 m de altitude e que contenham ruínas Incas. Além de acompanhar a equipe em tempo real com o SPOT Gen3, fizemos uma entrevista muito interessante com o trio! Confira com exclusividade no SPOT Blog:
Maximo, Pedro e Suzie: um alpinista extremo argentino, um geógrafo brasileiro e uma física britânica. De onde surgiu esse encontro?
Pedro e Maximo se conhecem há 17 anos e desde então começaram a escalar juntos. Pedro seguiu a carreira acadêmica e Maximo acabou virando guia de montanhas. Foi assim que ele conheceu a Suzie, enquanto guiava uma montanha técnica de 6850m no Nepal, em 2011. Maximo desenvolveu um método para descrever matematicamente uma montanha e quantificar a prominência dela. Suzie acabou aperfeiçoando este método e usou supercomputadores para conseguir os dados da expedição Montanhas Virgens. Os três se deram muito bem e já escalaram mais de cinco montanhas juntos!
Que importância vocês dão para o alpinismo e expedições exploratórias, em termos de preservação cultural e geológica?
Toda! Sabemos muito bem o quanto ainda não se sabe sobre os Andes. Para se ter uma ideia, o planeta Marte e a Lua têm melhores mapas topográficos do que algumas regiões dos Andes. Existem montanhas das quais nem sabemos a altitude, pois existem falhas nos dados coletados pelas missões satelitais. O jeito é ir lá e medir na mão mesmo. E fora a parte cartográfica, tem também a parte arqueológica. Existem milhares de sítios arqueológicos deixados pelos Incas há cinco séculos. Construções realmente maravilhosas cheias de tesouros e múmias. O problema é que todas estão em lugares extremamente inacessíveis e, acima de tudo, bem altos, onde só os alpinistas conseguem chegar. É uma sensação indescritível fazer esses achados! Geralmente, quando avistamos alguma ruína de longe, esperamos um ao outro para chegar ao cume e curtir o momento juntos. O difícil mesmo é o isolamento, e é aí que a SPOT Brasil é uma mão na roda. Até achamos engraçado quando apertamos o botão personalizado do nosso SPOT Gen3 e ficamos imaginando o que passa pela cabeça das pessoas quando elas olham o mapa com a localização dos lugares onde dormimos ou acampamos. É realmente no meio do nada!
Como é a sensação de fazer parte de uma expedição inédita no mundo, descobrindo montanhas virgens, locais inexplorados ou que estão há séculos sem civilização?
Fora a Suzie, já fazemos isso há algum tempo. Maximo com seu projeto de 6000m e Pedro com suas dezenas de viagens aos Andes. Já achamos inúmeras construções e subimos montanhas inéditas. A diferença agora é que viemos aqui só para isso. Tanto o Pedro quanto o Maximo se sentem muito confortáveis nos Andes, pois são uns dos maiores frequentadores da região. Durante as explorações, fazemos ascensões bem rápidas e dá cada vez mais vontade de descobrir mais e mais. Chegar à um cume desses é sem dúvida algo muito mágico. Naquele primeiro momento que você enxerga o lugar pela primeira vez, tenta se colocar na pele de quem ergueu a construção e imagina o porquê disso ou daquilo. Tratamos os lugares com um respeito enorme e só vamos lá para mapear e fotografar.
Suzie Imber e Maximo Kausch nos Andes, na última parte técnica de Sierra de Aliste, a sexta montanha da expedição | Foto: Caio Vilela
Algumas das montanhas e ruínas que estão encontrando não tem nome. Como funciona esse processo? Existe algum acordo com os governos do Chile e da Argentina?
Temos o Instituto Geográfico Militar (IGM) do Chile e da Argentina como cooperadores do projeto. Após dois anos de pesquisas para finalmente formar uma equação matemática que defina o que são montanhas e categorizá-las de acordo com sua prominência topográfica, chega a hora de colocar nomes em cada uma. Demoramos pelo menos seis meses para descobrir que centenas de montanhas ainda não têm nem nome. E isso falando só de cumes principais. Ainda tem milhares de cumes secundários que nem nós estamos perto de começar a catalogar.
Quando chegamos a um cume novo, procuramos saber como os locais o chamam e tentamos respeitar a grafia e a língua da região. Quando não há nenhuma evidência de nome, aí sim temos que ser criativos e inventar. Normalmente usamos nomes de vales, lagos ou acidentes geográficos próximos. Tudo isso para respeitar a nomeclatura local, pois ficaria muito estranho dar um nome como “Monte Zé Carioca” para uma montanha no meio do Chile. O único nome diferente que usaremos em nosso projeto será o Monte Parofes, em homenagem a um grande amigo montanhista do Pedro e do Maximo, que faleceu após um ano lutando contra a leucemia (conheça a história de Parofes aqui).
Qual foi o maior medo que tiveram quando partiram para a expedição?
Com certeza, o carro. Para vocês terem uma ideia de onde vamos: imagina você carregar gasolina e dirigir 300km até que uma estrada acabe, depois você dirige mais 80km seguindo marcas de pneu e linhas que marcamos pelas fotos satelitais. Daí você começa a dirigir por dias em lugares que nem marca de pneu tem. No caminho você tem que atravessar rios, regiões com quase um metro de neve, salares, campos de pedra pomes, campos de pedras afiadas como vidro, campos de talco vulcânico e etc. Aí você para o carro num lugar que venta 100km/h e faz 30 abaixo de zero à noite. Ali você acampa e vai escalar uma montanha desconhecida. Digamos que isso não é muito saudável para o carro. Claro que, se algo der errado, apertamos o SOS no nosso SPOT Gen3 para chamar um resgate. Só que mesmo assim os riscos são imensos. Fora o carro temos as rotas de escalada que também são completamente desconhecidas. Usamos apenas a nossa experiência para escolher os melhores (ou menos piores) caminhos para chegar aos cumes de uma forma segura. Certamente todas essas incertezas fazem tudo ser tão mágico e, por isso, nos atraem tanto.
Para vocês, o que significa estar redescobrindo montanhas e ruínas isoladas como essas?
Uma grande contribuição para o conhecimento. Fazer parte da história de um lugar não é algo que acontece todos os dias. Desde crianças sempre lemos histórias dos exploradores dos Andes agora nos sentirmos como eles.
Qual é a sensação de descobrir um local completamente isolado, onde o único traço de civilização são suposições de que havia, há séculos, um povoado ali?
É incomparável. Nos sentimos como parte do filme do Indiana Jones, com a diferença de que não tem gente má tentando nos matar. Aliás, seria bem legal se tivesse mais gente para dividir essas conquistas todas
Que impacto a descoberta destas montanhas trará para o montanhismo na América do Sul?
Esperamos que seja grande e traga atenção de várias disciplinas como cartografia e arqueologia. Mas, além disso, queremos divulgar mais o esporte. O fato de se tratar de brasileiros, que nem montanhas nevadas têm em seu país, é algo um tanto curioso. Não procuramos inveja dos outros ou qualquer coisa negativa. Para garantir isso, divulgamos todo o nosso trabalho de forma gratuita. Nossos mapas de GPS são algo muito valioso para montanhistas que podem ir para essas regiões no futuro. Nós marcamos pontos de água, refúgios, condições de estradas, altitude de cumes e até minas terrestres! Tudo isso é cedido gratuitamente para contribuir com o esporte. Qualquer um no Brasil pode acompanhar a nossa expedição em tempo real. As pequenas unidades Gen3 permitem que as pessoas vejam a nossa posição sendo atualizada a cada dois minutos e meio!
Se este projeto for bem-sucedido, vocês pretendem explorar outras montanhas virgens pelo mundo?
Já começamos. O MEF (Mount Everest Foundation), principal patrocinador da expedição exploratória, já pediu que rodemos o nosso programa de achar montanhas no Himalaia para descobrir quais são as montanhas virgens que têm por lá. Ideias não faltam! Já temos o projeto de explorar dezenas de cadeias montanhosas pelo mundo!
Quando o projeto acabar, qual o próximo passo?
Suzie tem que dar uma palestra na Universidade de Leicester, no Reino Unido. Depois vai para a Bélgica e EUA, em dezembro. Pedro vai ao Brasil guiar expedições e dar alguns cursos de escalada. Ele volta para os Andes em dezembro para levar clientes numa região próxima daqui.
Maximo vai para a Antártida escalar o Monte Vinson com o Gustavo Ziller. Em dezembro, ele ainda vai guiar o Aconcágua escalar mais duas montanhas. A ideia é voltarmos a escalar mais montanhas como estas em março!