E pra começar, conversei com o ultramaratonista Carlos Dias - que há mais de 20 anos leva o Brasil, literalmente, para os quatro cantos do mundo.
Ele, que já completou 106 maratonas e mais de 60 ultramaratonas (provas com percursos maiores que 42 km), conta pra gente um pouquinho da sua trajetória de vida que o levou, recentemente, a mais um dos desertos extremos do nosso planeta, o Deserto da Namíbia, na África Meridional.
Bora comigo nesse bate-papo com o considerado Super-Humano pelo Stan Lee, da Marvel!
- Carlos, quem é o “Carlos Dias” ser humano?
Sou uma pessoa que ama desafios, que ama a natureza, o contato com as pessoas de diversas partes do mundo, amo as brincadeiras com meu filho Vinícius, as conversas com os amigos, amo fazer da minha corrida um esporte mais colaborativo e não somente competitivo; amo fazer isso toda vez que abraço uma causa.
- E como surgiu o título de Super-Humano?
O título de Super-Humano chegou através do “The History Channel” que já acompanhava minhas expedições em ambientes extremos, mesmo eu não sabendo. Eu nunca imaginei ser escolhido ou eleito um “Super-Humano”.
O Stan Lee, da Marvel, criou o programa “Super-Humanos” da América Latina e eu fui o escolhido na categoria “corrida” por percorrer ambientes extremos sem ter lesão e por utilizar a corrida para ajudar a salvar vidas de crianças que lutam contra o câncer.
- Carlos, você sempre une o esporte à causas relevantes. Quem você está apoiando no momento e quem são seus principais apoiadores?
Eu abraço a causa do combate ao câncer infantil. Em 2008, eu conheci o Hospital GRAACC, que é referência na América Latina no combate ao câncer infantil, e desde então eu decidi que a minha corrida teria que ter um propósito maior do que somente buscar medalhas ou records.
Atualmente conto com:
Patrocínio - Moss Earth, Tegma Gestão Logística e Movida Aluguel de Carros.
Apoio - On Running, Espaço Laser e Fisio4sports.
E eu agradeço às empresas que patrocinam e as que apoiam meu trabalho.
- Em sua trajetória como atleta, quais os feitos você considera mais importantes?
Nos meus 28 anos de jornada, considero cada corrida como sendo importante, cada uma sendo parte de um intenso processo de aprendizado.
Porém, destaco:
- Os 4 desertos mais extremos do planeta, os quais fui o primeiro sul-americano a percorrer (Deserto Gobi, Deserto Saara, Antártica e Deserto Atacama);
- 250 km na Floresta Amazônica;
- Travessia do Oiapoque ao Chuí, 9.000 km em 100 dias;
- Travessia EUA, Nova Iorque a São Francisco, 5130 km em 60 dias;
- Círculo Brasil, correndo em prol do combate ao câncer infantil, 18.250 km em 325 dias;
- 24 horas nas 26 capitais e o Distrito Federal;
- Travessia do Chuí à Pacaraima, 10.000 km em 200 dias.
- Quais foram os desafios desse ano, 2021?
O ano de 2021 marcou o meu retorno aos ambientes naturais, após ficar mais de um ano treinando em casa por conta da pandemia.
Consegui terminar de escrever meu livro "Luz na Trilha - A jornada do Super-Humano Carlos Dias" e o meu documentário, que fala sobre transformar KMs em cura.
Fui para a Amazônia e percorri 200 km na floresta, me integrando com a Aldeia indígena Tatuyos.
Em outubro, após cumprir todos os protocolos: tomar as duas doses da vacina contra covid-19 e testes PCR, eu dei a largada à Namib Race, no deserto da Namíbia, o mais antigo do planeta e com as maiores dunas.
Foram 250 km em 7 dias de muitos desafios. A cada hora, rajadas de ventos intensos, calor de 51 graus de dia e 2 graus de noite, pedras pontiagudas, espinhos, montanhas, grutas, planícies de muito sal, muita areia e dunas gigantescas.
A cada etapa que terminava, a emoção era gigante! Até a chegada na Costa dos esqueletos… Quando desabei de tanta emoção! Uma prova que dedico às vítimas da covid-19, às crianças do hospital GRAACC - que lutam contra o câncer e ao meu filho Vinícius, que é a minha grande inspiração.
Os 250 km que percorri foram transformados em doações para o hospital GRAACC, através do aplicativo KM SOLIDÁRIO.
- Já tem programação para 2022?
Sim, termino um desafio e já tenho sempre o próximo. E para 2022 vou atravessar a Transamazônica, correndo e registrando em imagens a vida ao longo dessa rodovia de 4.300 km, que pretendo percorrer em até 90 dias.
Em Agosto, vou correr os 250 km em 7 dias na Lapônia, Finlândia e círculo Ártico.
Em Setembro, vou percorrer juntamente com o paratleta Vladmi Virgílio (atleta cego), os 800 km de Santiago de Compostela, em uma jornada espiritual.
Em novembro de 2022 vou organizar a ultramaratona 50 km, no Flona do Tapajós, Pará.
- Na sua opinião, o que não pode faltar no planejamento de suas expedições?
Eu sempre levo na mochila a carga certa, para que ela seja leve. Levo itens que realmente vou usar e que não gerarão mais peso ao longo da jornada.
Para áreas remotas, considero importante um bom seguro de vida e tecnologia de localização/comunicação via satélite - considero essencial para o caso de eu me perder.
- Já passou por algum (ou alguns) perrengue inesquecível?
Sim! Na Floresta Amazônica, em 2003, nos 250 km de prova tive uma onça me acompanhando durante 5 horas na parte noturna da prova. Eu e mais 4 atletas passamos momentos tensos até a chegada emocionante no acampamento.
E na Nova Zelândia, juntamente com o paratleta Vladmi Virgílio, ficamos presos por 25 horas nas cordilheiras após as fitas de orientação serem arrancadas, ou por erro humano da organização ou pelo vento. No final, vivemos uma experiência de respeito e companheirismo determinantes para voltarmos vivos daquelas montanhas.
Detalhe: tínhamos um chip de localização, mas as condições da montanha dificultaram a nossa localização pelos helicópteros. Ainda assim, foi crucial na diminuição das horas de resgate.
- Quais dicas você dá para quem quer iniciar na corrida ou esportes de aventura?
A dica que eu deixo pra quem quer começar a correr ou se aventurar em ambientes naturais é primeiramente entender o funcionamento do próprio corpo. Buscando ajuda de um médico, fazendo check-up, se auto-conhecendo.
Segundo passo: vá devagar. Passo a passo. Tenha paciência. Respeite seu organismo e as fases de progresso para conseguir avançar com qualidade.
O terceiro passo é buscar um profissional especializado nos treinamentos. No caso da corrida, por exemplo, apostar num bom fortalecimento para evitar lesões.
Hidratação aliada a uma boa estratégia de alimentação, também com apoio de especialistas.
Alimentando também pensamentos positivos, se inspirando em grandes histórias e ir viver os seus próprios sonhos. Sendo protagonista da sua própria jornada.
- Qual é a frase, o filme e a música que mais te inspiram na hora de abraçar os desafios?
Uma frase que eu gosto muito é do Isaac Israeli: "É gosto pervertido satisfazer-se da mediocridade quando o ótimo está a sua frente"
Essa frase é pra muitas pessoas que às vezes tem tudo ali na frente dela, tem os sonhos, os desafios, tem a vida e pelo medo de errar ou fracassar, o medo de tropeçar ou sentir dor, não avançam e vivem uma vida medíocre. Pra mim essa frase é bem marcante.
E uma outra citação que eu gosto muito é o que minha mãe sempre falava pra mim:
"Use seu sorriso como passaporte, sempre leve seu sorriso para atrair pessoas com a mesma sintonia e vibração que a sua".
Um dos meus filmes preferidos é de um bailarino chinês, Liu Qi Shu, nome do filme "Adeus China - O último bailarino de Mao". Esse filme mostra a história de um garoto chinês que vivia na pobreza, com 9 irmãos e que conseguiu fazer história dançando um dos balés mais importantes do mundo, tanto na Rússia como nos EUA. Vale a pena assistir.
Um livro que eu indico é o "Desafios e Oportunidades" de Paul Stutz, que criou o coeficiente de adversidade. Ele diz que quando seu coeficiente de adversidade é alto, você consegue lidar com o inesperado da vida, com as adversidades que a trilha te oferece, sem sucumbir, sempre com a postura entusiasmada.
- E pra finalizar, conta pra gente:
Um arrependimento
Eu não tenho arrependimentos, posso dizer que tudo o que vivi de bom ou ruim na minha vida, eu vivi de forma verdadeira, então, não tenho arrependimentos;
Um sonho
É sempre o próximo: cruzar a Transamazônica, correr no polo Norte, quero dar a volta ao mundo, correndo e transmitindo uma mensagem de entusiasmo para as pessoas;
Uma certeza
A certeza de que seguirei sempre incansavelmente buscando realizar meus sonhos, tudo o que eu colocar no papel. Sempre transformado quilômetros em sorrisos e cura de crianças que lutam contra o câncer;
Um medo
Medo de escuro, mas isso não me faz deixar de seguir em frente. No caso da Floresta Amazônica eu corri de noite, no escuro. No deserto da Namibia eu fiz sozinho todo o deserto, de 17 horas, ao menos 6 horas no escuro pelo deserto, eu e minha lanterna e meu entusiasmo;
Uma alegria
Uma alegria marcante foi o nascimento do meu filho. Nunca me esqueço do dia em que o peguei no colo, senti o calor dele e ali mudou tudo. Desde então avancei com mais força, realizei coisas que nunca imaginei fazer se ele não tivesse nascido;
Coragem é
Coragem de ir sempre de encontro ao meu sonho e assumir riscos. Nós corremos sentados no sofá ou no alto de uma montanha, mas acredito que o maior risco seja o de ficar sentado no sofá. Essa é realmente a zona da morte de qualquer ser humano;
2022 em uma palavra
Desafios, desafios, desafios.
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